Debaixo de um sol escaldante, sinto o bafo quente do asfalto no rosto e uma dor de cabeça dos diabos. Os sapatos apertados. Buzinas intermináveis acionadas por gente neurótica.
Calor insuportável. Enquanto percorro a gigantesca escadaria da Borges de Medeiros, os pensamentos invadem minha mente. Penso em tirar os sapatos e lançá-los para longe dali, arrancar o paletó, tirar a camisa e ficar mais à vontade.
As escadas são intermináveis. Além dos pés inchados, as pernas doem muito.
Buzinas, roncos dos automóveis, gritos e estrondos. No fundo dessa poluição sonora, um rosnado tão próximo. Olho para os lados e não vejo nada.
Subo mais lances da imensa escadaria sem olhar para os lados. Latidos de cães ferozes em meus ouvidos. E os sons cada vez mais fortes.
Já estou na Duque de Caxias, em frente ao edifício Morzart. Um pouco perturbado, toco o interfone. Espero a voz de resposta do outro lado da linha. O mesmo ladrar de cães ferozes de antes. Tremo e suo frio. Segundos depois, a voz de um homem ordena subir.
Elevador. Um... dois... três... quatro...
O décimo oitavo andar está distante. Inspiro e tento recuperar o fôlego e me acalmar. Penso por um instante em desistir, e apertar o décimo sétimo e descer. Ainda há tempo. Estico o braço esquerdo, mas não tenho coragem prosseguir a ação. Solto o braço, que fica como chumbo, abandonado, encostado na cintura. Fico estático até o elevador parar no décimo oitavo andar e abrir.
Tomo coragem e, ao mesmo tempo em que aciono a campainha, a porta se abre e de dentro do apartamento surge um cão de raça e feroz...
Nenhum ruído desta vez.
Apenas os meus olhos e os do cão se encontram.Olhares perros.
Excelente narrativa Ari, surpreendente.
ResponderExcluirBom final de semana.
Jefhcardoso do http://jefhcardoso.blogspot.com
Interessante a forma como o homem se direciona para o apartamento, cercado pela ferocidade da cidade para dar de cara com a ferocidade do cão. É como se não pudesse ter descanso em lugar algum. Boa metáfora da vida moderna.
ResponderExcluirUm abraço!